25/10/2014

Carlos Drummond de Andrade - "Memória"




Memória
(in Claro Enigma, 1951)

"Amar o perdido
deixa confundido
este coração.

Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.

As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão

Mas as coisas findas
muito mais que lindas,
essas ficarão."

Notas pessoais.
O saudosismo de Drummond encanta porque o ser humano insiste em viver das suas lembranças.
Profundamente humano, portanto, E belo, porque demonstra o quão raro é o sentimento verdadeiro, intimo, aquele que tem a propriedade milagrosa de alterar nossas essências, nossas convicções, que nos retira do equilíbrio falso para nos lançar no movimento do mundo. É o que ficará!
Há outra leitura: Drummond defende que são as coisas findas que ficarão, menos que as meramente lindas. Para que se reste algo é preciso que este finde e é justamente ai que reside sua beleza. A beleza é a que permanece após o findar. Faz sentido. Essa leitura faz pouco sucesso, naturalmente.
Não é tão grave não saber porque esse poema surge à memória (tautológico): parece ser mais fruto de minha reminiscência bendita, apontando o passado, qualquer que seja o seu tempo, como tão presente, tão vivo e sensível. 
Mas o fato da vida é que precisamos seguir adiante (como Drummond). Independente da leitura que se faça, as coisas lindas, mesmo findas, não se perderão enquanto a natureza humana insistir, apenas com esperança, em ter recuperada a essência milagrosamente alterada e perdida.   


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